Cansada, chutou as sapatilhas que calçava o mais longe que pôde e jogou-se no sofá com os pés para cima, tentando encontrar a posição mais confortável. Coçou as costas, desgrenhou os cabelos com os dedos e fez uma careta ao lembrar-se que havia na cozinha uma pilha de louça esperando para ser lavada. Grunhindo e reclamando de si para si, levantou-se e foi encher-se de sabão.
Enquanto ariava uma das panelas para que "brilhasse como nova!", como sua mãe sempre exigia, pôde ver nela o reflexo de sua imagem descabelada e suada. A exaustão causada por sua rotina era visível e sentiu um certo alívio por estar dentro de sua própria casa, sozinha, escondidinha entre seus defeitos. Detestaria se expôr e ser vista num dia como aquele.
E foi enquanto pensava nisso e dava mais brilho à panela que pôde ver outro reflexo. Dessa vez, não se tratava do de si mesma, mas da imagem de outra pessoa.
Um garoto a observava. Acompanhava, através da parede, cada movimento de sua intimidade - seus piores e mais constrangedores momentos! Temporariamente paralisada, ela apenas fitou o reflexo por mais alguns instantes, tentando absorver o que se passava. Por fim, lembrou-se da explicação mais simples que havia para aquela situação toda.
Havia se esquecido: morava numa casa de vidro.
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